sábado, 11 de agosto de 2012

O PAI DO PASSARINHO


Todo mundo sabe como Miguel é um bebê abençoado. Sua vontade de viver se sobrepôs as adversidades, recebeu o cuidado de profissionais maravilhosos, teve um bom pós-UTI, não tem sequelas...
Mas um dos principais motivos do sucesso dessa criança é seu pai.
Falo agora sobre o homem que Deus colocou no meu caminho para ser o pai do meu filho.
Nos conhecemos no trabalho e namoramos à distância mesmo com muita gente contra. Casamos e fomos morar em Sampa. Priorizamos os estudos e queríamos nos formar antes de encomendar um bebê. Sempre soubemos que caso fosse um menino se chamaria Miguel. Era um acordo que fizemos quando ainda namorávamos ao ver um menino lindo e levado num passeio de barco.
Ficamos grávidos, até que tudo aconteceu. Ficamos juntos o tempo todo. Ao longo a UTI, alternávamos os momentos de crise. Quando eu fraquejava, ele se mantinha firme para me segurar e eu fazia o mesmo.
Miguel nasceu no meio da Copa do Mundo e lembro nitidamente dos boletins diários sobre os jogos que Luciano contava para o bebê.
Um dos piores momentos de Luciano foi numa noite em que eu estava muito gripada e não pude ir à UTI. Ele foi e demorou a ligar. Eu não aguentei e ele respondeu a ligação aos prantos contando que Miguel teve várias convulsões. Quando chegou choramos juntos e sabíamos que o pior estava por vir. Era a temida Meningite. Quando o diagnóstico se confirmou, o pavor nos dominou e tivemos a certeza de que nosso bebê teria sequelas irreversíveis. Combinamos que só pensaríamos nisso na hora em que a deficiência aparecesse. Seguimos com a vida. Afinal Miguel precisava primeiro sobreviver para ter sequelas. O que graças a Deus, não aconteceu.
O segundo e pior momento foi quando tivemos que nos despedir dele. Luciano ficou em frangalhos e chorava copiosamente. Era seu primeiro dia dos pais e passamos o domingo aguardando a morte do nosso filho. No último dia 07/08 fez dois anos que isso aconteceu.
Sempre estivemos unidos em todos os perrengues. Sempre.
Junto comigo, ele acompanhava diariamente o peso, a dosagem do leite, o cocô, os remédios, tudo. Nunca reclamou de nada. E se me recordo, nunca brigamos por nada nesse período. Nada mais importava, só o nosso esperado e tão difícil quanto amado filho.
Resistimos a UTI e quando finalmente trouxemos o bebê para casa, era hora da adaptação. Mãe é mãe, não tem jeito. Mas pai, nem sempre né?
Mas não era um pai qualquer.  Era um “Pai-de-UTI”. Era o Luciano.
Ele aprendeu a dar banho, fazer mamadeira, trocar fraldas e tinha uma paciência de Buda. E ainda tem.
Hoje rimos com todas as gracinhas e juntos ficamos estasiados em como tudo acabou bem. Acabou não. Como diz Renato Russo na música Metal Contra as Nuvens:
" E nossa história, não estará pelo avesso assim, sem final feliz. Teremos coisas bonitas para contar. E até lá, vamos viver. Temos muito ainda por fazer. Não olhe para trás, apenas começamos. O mundo começa agora, apenas começamos."

Luciano vai ensinar Miguel a andar de bicicleta e a fazer o dever de casa. Vão ao estádio juntos ver o São Paulo e o Botafogo (sim, tem que torcer para os dois times).
Miguel vai fazer perguntas absurdas que ele vai se virar para responder. Vão jogar bola e dar banho no cachorro no quintal enquanto eu preparo o almoço.
E quando eu me meter, Miguel vai falar: “Isso é coisa minha e do meu pai.” (e eu vou falar algum palavrão é claro).
Luciano é um cara honesto, lutador e divertido. Um exemplo a ser seguido. O passarinho não mata seus leões sozinhos.  Não com o papai (e a mamãe) por perto.

Dedico esse texto ao Pai do Miguel e a todos os “Pais-de-UTI”. Algumas vezes - principalmente no hospital, eles ficam um pouco de lado. Mas estão sempre presentes.

Grande Beijo e até a próxima.

Carolina

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Miguel faz 2 anos!!!



Há exatamente dois anos, acontecia a maior transformação da minha vida. Mais que mudar de cidade ou casar...
Sempre fui uma pessoa estranha. Não tinha modos, paciência (continuo com pouca), flexibilidade e tinha o prazer de ser rebelde. Mas o tempo passa e a vida muda e nos transforma. Acho que é por isso que estamos aqui.
Hoje eu continuo com pouca paciência, melhorei meus modos e flexibilidade. E quanto a ser rebelde... bom,  isso é da minha natureza e DNA indígena, fica difícil de mudar.
Mas, ter um filho prematuro não é tarefa fácil, e a vida se mostra sob novas circunstâncias, então aprendi a dar valor às coisas mais simples. Como um cocô na fralda, por exemplo.
Estou mais calma, mais sensível, responsável, atenta e sei o que é realmente importante.
Tudo isso é culpa do Miguel. Há dois anos, essa criatura veio ao meu mundo da forma certa por linhas tortas.
Depois de um tempo a gente percebe que nada foi por acaso. O sofrimento, a agonia, o local, as pessoas que cuidaram dele, toda a situação. Tudo foi um plano superior. Eu precisava entender  algumas coisas antes de ter meu filho nos braços. Toda a longa jornada não foi em vão.
Quando se tem um filho, experimentamos o sentimento maior desse mundo, sentindo um amor que dói, um amor que não tem nome. E quando a dificuldade e o sacrifício se fazem presente, aí que dá mais vontade de lutar, é nessa hora que você sabe que vai valer a pena.
Foi quando meu coração saiu do peito e agora atende pelo nome de Miguel.
Dois anos se passaram e Miguel está uma figura: Não pode ouvir o barulho do chuveiro que começa: “Manho! Manho!”. Não pode ver um carro: “Cáaoo, cáaoo”. A galinha pintadinha virou “Pó-pó” e os cachorros: “Au, au, au”. Manda beijos estalando os lábios e batendo a mão espalmada no rosto. Chuta bolas e grita com sua voz rouca: “Mooolll”.
No último mês nos mudamos para o Rio de Janeiro e estamos começando uma nova vida. Junto do primo, Miguel tem que aprender a se virar e se defender. Vai se desenvolver mais rápido.
Já anda muito e por todos os lugares, não para quieto um minuto. Come de tudo e parece um saco sem fundo. Está numa fase chatinha, já que todos os dentes estão nascendo ao mesmo tempo e ele sente dor. É muito esperto, sorridente e às vezes bem ranheta.
Miguel é meu tudo. Como disse, sempre fui esquisita, mas com ele é diferente. Meu filho tem o melhor de mim. Ele é o melhor de mim.
Hoje, Miguel completa dois anos de vida. Uma vida ainda curta, mas já intensa e com muita história para contar.
A fábula continua. Talvez já não seja mais uma fábula, é uma história real. O passarinho matou seus primeiros leões e está crescendo. E nós como pais, crescemos junto com ele e para ele.
Que venha sua nova vida. Estaremos juntos. A jornada é nossa, mas vocês seguem junto com a gente.
É hora, é hora, é hora, é hora, é hora! Rá! Tim! Bum! E viva o Miguel.
E na hora de soprar as velinhas, o pedido é um só: SAÚDE PARA O PREMATURO QUE CRESCE!!!

quinta-feira, 19 de abril de 2012

PERIPÉCIAS DE MIGUELITO


Ok, ok. Eu sei que demorei a escrever, perdoem-me. Mas a vida está muito corrida.

Sem mais delongas, uma pequena retrospectiva em números:

28 semanas de gestação, 720 gramas de peso. 1 cirurgia cardíaca. 1 de hérnia. 2 infecções sendo que uma delas trouxe a meningite. Ventilação mecânica por 90 dias (tubo). Pneumotórax (ar no tórax que deve ser drenado). 41 transfusões de sangue. Hipertensão pulmonar, trombose e finalmente 2 Hérnias. 5 meses de UTI Neo Natal.

Passados 8 meses de alta, uma nova internação. Mais 20 dias de UTI infantil e uma Bronquiolite.

Passou, passou. Miguel tem hoje 1 ano e 10 meses, 69 cm, e 6,950kg. Come como um dragãozinho, mas é magrelo como um pardal. Não chega aos sete quilos por nada nesse mundo.

Na cabeça, muito cabelo loiro (juro!), na boca apenas dois dentes (que chamo de “Os gêmeos”).

Adora cachorros e os chama aos gritos de “Ia-iá” (não me perguntem por que) e quase vira estátua assistindo a mala, porém útil: Galinha Pintadinha.

È sério, esses vídeos são bem bonitinhos e devem conter algum tipo de mandinga ou bruxaria porque realmente prende e paralisa a criança.

Mas, depois de assistir umas 385.427 vezes, você se pega cantando o tal do “pó-pó-pó-pó-póóó´” dentro do metrô, no ônibus ou mesmo no chuveiro. Fora a peste da “Mariana conta três, Mariana conta três: é um, é dois, é três! Ana, viva a Mariana...”

Tem também a praga da barata: “A barata diz que tem 7 saias de filó, é mentira da barata, ela tem é uma só: há-há-há, hó-hó-hó, ela tem é uma sóóó”. (escrevi as músicas só de sacanagem para vocês ficarem com elas na cabeça assim como eu).

A preferida dele é o tal do Pintinho Amarelinho. Aquele mesmo! - que cabe aqui na minha mão. Miguel aprendeu a mostrar que cabe na mão dele também. Ele faz o gesto com o dedinho direito encostando várias vezes na palma da mão esquerda. Uma graça.

Miguel adora música. Não resiste a um comercial de supermercado ou abertura de novela. É o suficiente para ele se ajeitar e começar a se balançar. Olha para gente mostrando os dentes gêmeos num sorriso e continua sua coreografia digna do “Seu Coisinha de Jesus”.

Na maioria das vezes a televisão fica no canal infantil e passamos as noites assistindo desde Backyardigans (os bonequinhos coloridos do quintal) e o tal do Barney - um dinossauro roxo meio afeminado, mas que canta umas músicas (bestas), então já viu...

A mim só resta deixar meu CSI e telejornais de lado para assistir a todos os monstrengos cantantes com meu filhote. E como toda mãe com filho nessa fase, orar para a Bendita Santa... A Santa Paciência, para assim decorarmos felizes todas as musiquinhas. Já que eles amam e elas ajudam na hora dos perrengues como trocar de roupa ou cortar as unhas.

O passarinho ainda não voa, mas está engatinhando. Essa era uma coisa que eu sempre sonhei. Acho lindo bebê engatinhando. E lá vai ele pela casa, sempre parando para abrir e fechar várias vezes qualquer porta que esteja pelo caminho. Abre gavetas e as esvazia com movimentos rápidos, para logo seguir em frente em busca da próxima novidade. E lá vou eu, recolhendo as coisas atrás dele.

Estou tentando ensinar a criatura a guardar tudo que bagunça. Mas é claro que desarrumar é muito mais legal e ele finge que não entende. Das 15 coisas que jogou para fora, guarda apenas uma e já me deixa falando sozinha. Como diria minha tia, me dando “o traseiro como resposta”.

É um safado. Estala os lábios e manda beijos. Dá tchau e cospe todo mundo mostrando a língua e soprando ao mesmo tempo, basta falar: Eca, Miguel, Eca !!!.

Quando a gente pede para ele pensar, leva as mãos e bate na cabeça como se estivesse desesperado com as contas que tem pagar.

Não pode ver um computador que já começa a gritar: “tê-tê, tê-tê!! É sério, porque ele sabe que ele vai ver a tal da “franga com pequenas manchas” (shiiiiiiu, ele não pode ouvir o nome real da coisa, ou vai começar a gritar pedindo: “tê-tê”.

E eu não estou podendo.

Agora é sério. São cenas bonitas de ser ver. Enche o saco todos aqueles desenhos musicais, mas no fundo é muito legal. Acompanhar todas as fases, tudo o que ele aprende, é de uma felicidade enorme.

Aquele projeto de gente, que quase morreu algumas vezes, está descobrindo o mundo. E eu vou junto com ele. Descobrindo tudo de novo. Só que dessa vez, através de seus olhos negros curiosos.

O prematuro segue seu curso. Devagar. No seu próprio ritmo. Mas a gente não tem pressa. Esse é o lado bom. Diferente das outras pessoas, meu filho vai ser bebê por mais tempo.

Então eu vou ter que aturar um pouco mais (com prazer) todos os monstros bizonhos que cantam. E vou cantar junto com eles, para alegria de Miguel, que se sacode em sua dança e me dá um enorme sorriso praticamente vazio.